Instituto Fênix: ONG atua no Recife focada em ressocializar pela formação profissional 4h1b50

Foto: Reprodução/Google Maps 6y312a
Oportunidade é a palavra-chave na trajetória de quem busca mudar de vida, seja por um desejo profissional ou por sobrevivência. Em um país tão desigual como o Brasil, a realidade contraria ditados como “Deus ajuda quem cedo madruga”, porque afinal, emprego e renda não dependem do despertador. E quando preconceitos de gênero, classe e raça entram no jogo, o caminho para conseguir “uma chance” é ainda mais difícil.
Mas um grupo particular de brasileiros carrega uma classificação capaz de fechar portas como nenhum outro preconceito: “ex-presidiário”. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 20% dos ex-detentos conseguem um emprego formal em até dois anos após a libertação. Um número sabidamente subnotificado, ainda mais porque, como aponta o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), cerca de 70% dos ex-presidiários vivem em situação de vulnerabilidade.
Com a rejeição, para quem consegue se distanciar do mundo do crime, o empreendedorismo surge como uma possibilidade urgente - e que justamente por não haver a devida instrução, na maioria dos casos, tende a não se sustentar e causar ainda mais problemas na vida de quem precisa recomeçar.
Foi pensando em contornar essa constante que, há 3 anos, no Recife, surgiu o Instituto Fênix: uma Organização Não Governamental (ONG) com foco na ressocialização por meio da formação profissional e empreendedora. O trabalho desenvolvido no bairro dos Coelhos, na região Central da capital pernambucana, foi um dos destaques do 22º Prêmio Innovare, que reconhece iniciativas que contribuem para aprimorar a Justiça no Brasil.
Todo trabalho que hoje atende direta e indiretamente a centenas de famílias surgiu da vontade de um ex-detento de ajudar a outras pessoas que, assim como ele, queriam uma oportunidade para mudar de vida e superar as barreiras do preconceito e da discriminação.
Cícero Alves
O alagoano Cícero Alves, de 42 anos, é o primeiro brasileiro a concluir uma faculdade em regime fechado. Em 2014, já ados cinco anos de reclusão por um crime que alega não ter cometido, ele prestou o Exame Nacional do Ensino Médio para Pessoas Privadas de Liberdade (ENEM-PPL), pelo qual conseguiu uma bolsa de estudos para cursar istração à distância. No cárcere, em um dos 10 computadores disponibilizados na unidade prisional, Cícero também realizou mais de 80 cursos profissionalizantes e duas especializações.
Tendo deixado a cadeia em 2019, Cícero se mudou para Pernambuco e começou a realizar palestras motivacionais para os detentos com o objetivo de que não retornassem ao mundo do crime. Enquanto isso, ele também deu início à graduação em Direito, finalizada no último mês de fevereiro. Toda essa experiência - de vida e educacional - permitiu a criação do Instituto Fênix, com o apoio de voluntários, empresários e agentes do Direito.
“Eu sempre tive em mente que um dia eu ia ter que sair, ia ter que recomeçar a minha vida. O Instituto Fênix nasceu em 2022 com essa perspectiva de levar a qualificação profissional, de tentar inserir essas pessoas ou no ensino formal ou então no ensino superior e até mesmo encaminhá-las ao mercado de trabalho. A nossa instituição já conseguiu atender mais de 2.100 pessoas, entre egressos, jovens em conflito com a lei, familiares dessas pessoas e o público em geral. A nossa instituição pensa o seguinte: se nós devemos realmente diminuir a criminalidade, eu não posso esperar que uma pessoa cometa um crime para que eu possa começar a ajudar essa pessoa”, afirma.
Assim, o Instituto Fênix consegue atuar em três frentes para divulgar os cursos profissionalizantes e demais atividades desenvolvidas: indo até os estabelecimentos de privação de liberdade, por meio das redes sociais ou através de parceiros como o Senac. Cícero também explica como o trabalho é feito com cada pessoa que a a ser assistida pelo instituto - que é formado em sua maioria por voluntários e pela equipe gestora.
“Há todo um processo quando essas pessoas chegam aqui. Elas am por um treinamento, é aplicado teste de perfil comportamental para entender um pouco essa pessoa e ter a segurança para poder encaminhá-la ao mercado de trabalho ou à qualificação profissional. E também existe o atendimento individual, onde aquela pessoa que participou da nossa seleção é atendida pela psicóloga e pela assistente social. Fora isso, há também um atendimento jurídico, que é quando essa pessoa a por todo o processo para analisar como é que está a situação dela e o que é que precisa ser feito ou não”, destacou.
Vulnerabilidade
A urgência da necessidade de renda e a insegurança causada pelo preconceito são os maiores desafios enfrentados pela equipe do Instituto Fênix. Por vezes, retornar ao mundo do crime é uma possibilidade mais atrativa e tem potencial de trazer lucro com mais rapidez do que ar por um curso profissionalizante para, futuramente, abrir o próprio negócio.
A voluntária Giselly Vanderley conta que há um banco de dados com quase 1600 egressos do sistema prisional no radar da ONG, e por meio desse levantamento são oferecidos os cursos de acordo com as características de cada perfil. No entanto, dadas as condições de vulnerabilidade, esse contato precisa ser quase que diário - o que não é possível diante do tamanho da equipe, que chega a no máximo 12 pessoas.
“Acho que a gente tem uma visão muito diferente de como é lá fora e depois, quando entramos aqui, temos uma visão diferente de como as pessoas são, de que todo mundo também merece uma oportunidade. Não vou dizer a você que é fácil, é muito difícil. A gente tem que estar atrás, saber que eles mudam o contato, saber que hoje o endereço pode ser um, amanhã pode ser outro. A gente fala aqui que é uma meta todo dia, mas é muito gratificante no final”.
Giselle também detalha como é o contato pessoal com cada assistido pelo Instituto Fênix.
“A gente mesmo aqui acaba virando psicóloga de cada um, conversando um pouquinho, sabendo como é que tá o dia a dia, sabendo como é que tá a vida. Ajudando da forma que a gente também pode, porque eu acho que a gente aqui se torna uma família de verdade. Todo mundo consegue se ajudar aos pouquinhos”, contou.
Para o fundador Cícero Alves, que conhece a sensação de ter uma “porta fechada” para o trabalho formal, é preciso mudar o olhar do empresariado para permitir que haja diminuição do índice de reincidência carcerária, que de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), acontece com cerca de 40 a cada 100 egressos no Brasil.
“Eu recebi aqui um senhor que, com mais de 60 anos de idade, estava trabalhando em uma dessas prefeituras. E infelizmente ele foi colocado para fora porque tinha acabado a pena dele. Ele chegou aqui para perguntar ‘para onde eu vou agora com a minha idade?. Eu tenho quatro filhos, como é que eu vou manter meu filho?’. Quando uma empresa ou um órgão público contrata uma pessoa pela Lei de Execução Penal, ela está contratando uma pessoa por um prazo de validade. Já recebi pessoas que disseram o seguinte: ‘eu prefiro cometer um outro crime para poder conseguir um emprego’. Então, a gente tem que realmente mudar essa realidade do empresariado para mostrar para eles que eles precisam dar uma oportunidade para que essas pessoas possam recomeçar”, indicou.
Inclusão Socioprodutiva
Em matéria de recomeço, o Sebrae é um dos principais apoiadores do empreendedorismo no Brasil. Dado o número de 40 milhões de trabalhadores atuando na informalidade (IBGE), a entidade tem se preocupado cada vez mais em contribuir para que as novas micro e pequenas empresas criadas no país sejam sustentáveis e consigam se manter, como explica a Gerente de Políticas Públicas do Sebrae/PE, Priscila Lapa.
“É justamente a gente trabalhar públicos em maior situação de vulnerabilidade, levando para eles o empreendedorismo como uma oportunidade de emancipação econômica, de formação cidadã e de inclusão no processo produtivo do país, gerando renda e fazendo com que a economia também possa se favorecer com tudo isso. O resultado é um jogo de ganha-ganha. Ganha a economia, ganham os governos e ganha a sociedade como um todo, com mais pessoas participando de maneira cidadã estruturada do processo produtivo”, observou.
De acordo com o próprio Sebrae, baseado em dados da Receita Federal, o Brasil tem atualmente 21,7 milhões de pequenos negócios, incluindo microempreendedores individuais (MEI), microempresas e empresas de pequeno porte. Esse número representa 97% do total de empresas no país, sendo responsável por 26,5% do Produto Interno Bruto (PIB).
Para Priscila Lapa, em especial, quando uma micro e pequena empresa é criada por pessoas em situação de vulnerabilidade - a exemplo de egressos do sistema prisional - o trabalho de levar informação e formação de qualidade para esse público deve ser ainda mais objetivo.
“Se para você formar um país com mais empreendedores é preciso levar essa mensagem para a escola, para que as pessoas comecem a considerar o empreendedorismo como uma possibilidade para a sua vida, imagine quanto a esses públicos que estão totalmente fora do processo produtivo - seja por uma razão do meio de onde nascem, seja por uma situação de violência, seja porque estão compondo o sistema prisional. São públicos que historicamente não estão participando da população economicamente ativa. Então, o Sebrae vem olhando para esses públicos em situação de vulnerabilidade, do ponto de vista econômico, para que possamos ter uma atuação mais específica e consigamos chegar neles também”, disse.
Futuro
Antes da chegada ao Sebrae ou a outras entidades do Sistema S, com foco na profissionalização, organizações não governamentais como o Instituto Fênix, no Recife, desempenham um papel fundamental no meio do caminho - realizando as costuras necessárias para que pessoas em vulnerabilidade social possam sonhar.
E por isso mesmo Cícero Lucena, fundador do Instituto Fênix, também sonha com a expansão das atividades da ONG a partir da consolidação do trabalho em Pernambuco.
“Meu foco principal é consolidar em Pernambuco, embora a gente já esteja na Paraíba, tanto em Santa Rita como em João Pessoa, com uma parceria com algumas empresas, com treinamento. Mas o nosso foco é avançar sim, para que o Fênix possa se tornar uma referência na reintegração social dessas pessoas para diminuição da criminalidade”, concluiu.
O próximo o é a inauguração da padaria social nas dependências do prédio da instituição, cedido pela Santa Casa de Misericórida do Recife. A padaria é fruto do apoio da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, e assim o Instituto Fênix vai conseguindo expandir sua atuação.
Do sonho de um revolucionário - o primeiro detento a se graduar em uma unidade prisional - tornam-se possíveis os sonhos de tantos outros egressos do sistema carcerário que, para mudar de vida, serão ajudados a superar preconceitos e construir a própria oportunidade.
Edição de texto - Daniele Monteiro
Sonorização - Lucas Barbosa
Reportagem - Lucas Arruda
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